Francisco José (Padre Zezinho)
O filme “diários de motocicleta” de Valter Salles concorrerá ao prêmio ‘Palma de Ouro’ em Cannes. O cineasta relata no filme a mitológica viagem de motocicleta que Che Guevara fez pela América Latina. O título do filme de Walter Salles poderia ser o nome do diário de um caboclo coariense em Roma ou do diário de um romano em Coari. O certo é que tanto um como o outro convive no seu dia a dia com esta realidade.
Já fazia alguns dias que pensava em escrever um artigo tratando da relação entre Roma e Coari, pois, quem nasce em Coari e vai morar em Roma ou quem nasce em Roma e vai morar em Coari, encontrará uma coisa em comum nessas duas cidades, as motocicletas.
Tanto em Roma como em Coari, tivemos uma motocicleta símbolo. Coariense que tem mais de quarenta anos se lembra com saudades da Yamaha 100, elas entravam em Coari, via Tabatinga. Quem tinha se orgulhava da sua motoca. A mesma coisa acontece em Roma. Romano que tem mais de quarenta anos se lembra com saudades da lambreta Vespa. Cantada aí no Brasil pelo nosso rei do brega, Reginaldo Rossi… ♫ No fim do baile na minha lambreta ♫…
A Polícia Federal veio, levou as Yamaha 100. A Honda invadiu a cidade com os seus modelos, principalmente a 125. Na primeira vez que morei em Roma, nos anos de 1996 a 1998, a Honda praticamente não existia por aqui. Retornando, fiquei surpreso com a quantidade de motocicletas Honda, e sem falar na infinidade de modelos. Os modelos existentes em Coari não existem aqui, estando aqui olhando para lá, percebe-se que somos pobres para consumir a diversidade de motocicletas que são colocadas no mercado romano e que às vezes na hora de comprar se chega a ter dúvidas qual é a que eu mais gostei, a mais bonita, a mais charmosa, a mais potente, a mais prática, nessa hora o bolso fala muito.
Como é bom ter uma moto nova, ficamos orgulhosos dela, e com ela vamos cortando as ruas coarienses, sentindo no rosto o vento que vem do lago, pureza da natureza; algumas motos duram toda a vida do dono. Em Coari quanto mais a moto dura, mais ela prova sua resistência, mais é boa, como costumamos dizer. Em Roma já não é assim, o mundo do consumismo não permite que uma pessoa fique longos anos com a mesma moto e nem que um outro compre uma moto com a quilometragem alta, só restando um futuro para a moto, o ferro velho; porém, para colocá-la no ferro velho se paga e muitas são abandonadas pelas ruas. Andando pela cidade é muito comum ver motos sem donos.
Roma cidade eterna, programada para cavalos e carruagens, por isso não tem garagens e são poucos os estacionamentos; ruas estreitas e becos estreitíssimos. A moto por ser pequena entra em qualquer espaço; deste modo, torna-se prática, fácil de ser usada. Nos grandes cruzamentos, na hora da volta do trabalho para casa, quando o semáforo troca o verde pelo vermelho, são dezenas e dezenas de motos a esperar a nova troca do vermelho pelo verde. Assistir este momento é ser transportado de Roma para Coari, tudo se transforma em saudades.
Na mudança das idades da adolescência para a juventude, seja o coariense como o romano, o objeto de desejo mais sonhado é a moto. Acelerar, peito aberto ao vento, se sentir livre, num voo, é que a vida está a se abrir diante de si.
Afinal uma ragazza – uma cabocla na garupa de uma moto é sempre uma ragazza – uma cabocla em Coari, em Roma ou em qualquer lugar do mundo. Acelera ragazzo – acelera caboclo.
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