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Coari entre a década de 1960 e 1970: da castanha-do-pará à modernidade

1970

Archipo Góes

A cidade de Coari passou por um processo de modernização na década de 1960 e 1970, com o fim do ciclo da castanha-do-pará, a crise econômica de 1968 e a chegada de novas políticas públicas do governo federal.

Nesse texto analisaremos a cidade de Coari a partir de um foco específico na evolução temporal da cidade com um enfoque histórico, econômico e sociocultural. Dissertaremos mediante um olhar retrospectivo apontando uma sequência de fatos sociais que levará o leitor a uma viagem no tempo até a Coari entre 1969 a 1970. Um local, no meio da floresta amazônica que começava a passar por profundas transformações no seu modo de viver.

A história da evolução econômica de Coari está diretamente ligada ao extrativismo, sendo os ciclos da borracha e da castanha-do-pará os mais importantes. Ao longo de muitas décadas, a extração da castanha-do-pará foi a principal atividade econômica do município, encerrando assim o ciclo de grande produção nos anos 1960 e 1970.

como estava a economia da cidade?

Coari possui uma história próspera com a extração da castanha-do-pará, que iniciou no começo do século XX. Os proprietários dos castanhais foram responsáveis por trazer as primeiras indústrias de manufatura, que transformam matéria-prima em produtos. Além disso, eles investiram significativamente na melhoria da cidade. Em 1940, o município de Coari se destacou como o maior produtor de castanha-do-pará do estado do Amazonas, com uma colheita de 3.312 toneladas. Esse número representava cerca de 40% da produção total do estado.

A colheita da castanha era direcionada exclusivamente para o mercado internacional, o que resultava em uma demanda limitada e inflexível, ocasionando uma instabilidade significativa nos preços do produto. Além disso, não havia um mercado consumidor estabelecido no Brasil, nem indústrias para beneficiar as amêndoas através da desidratação ou extrair o óleo da castanha para a produção de cosméticos.

Na década de 1960, os comerciantes financiavam a produção dos colhedores, fornecendo-lhes gêneros e mantimentos. O valor desses produtos seria posteriormente descontado da quantidade de castanha produzida, comprada nos rios de origem e transportada pelos regatões. Embora primitivo, esse sistema de regateio contribuiu para o considerável desenvolvimento comercial da cidade de Coari, que se tornou um polo em relação aos municípios vizinhos. Além disso, sua área de influência se estendia até a tríplice fronteira, através do alto Solimões e seus afluentes.

1970
Castanha-do-Pará

Em 1968 aconteceu a “grande depressão” coariense. O município enfrentou uma crise econômica de grandes proporções devido à queda no preço pago pelas empresas exportadoras de castanha-do-pará. Esse preço ficou muito abaixo do valor estabelecido nos contratos de financiamento, causando consequências desastrosas para a região amazônica. O comércio em terra apresentava um alto nível de desenvolvimento. No entanto, as estreitas relações com os regatões e a exploração da castanha também os tornavam vulneráveis aos impactos do fracasso da safra de 1968. Isso acontecia devido ao fato de que os comerciantes costumavam financiar suas compras por meio da rede bancária, como o Basa em Coari ou o Banco do Brasil em Tefé.

A SAÚDE PÚBLICA EM COARI

No ano de 1970, as condições de atendimento médico e sanitário em Coari eram precárias, inclusive na sede do município, onde apenas algumas poucas facilidades estavam disponíveis.

A única enfermaria disponível em Coari era o Hospital e Maternidade N. S. do Perpétuo Socorro, mantida e administrado pelos padres Redentoristas e pelas irmãs ASC. Infelizmente, em 1969, devido à escassez de recursos financeiros, o hospital teve que ser fechado, deixando a população do município sem acesso a leitos hospitalares.

A população de Coari estava ansiosa pela conclusão das obras de montagem e instalação de um hospital pré-fabricado na Inglaterra, previsto para inaugurar no próximo ano. Essa conquista representaria uma verdadeira libertação de anos de sofrimento e negligência por parte do poder público em relação à promoção da saúde no município de Coari.

A solenidade de inauguração da Unidade Mista de Coari, construída pela SUSEMI (Superintendência dos Serviços Médicos do Interior), ocorreu às 9h de um sábado, no dia 6 de março de 1971. O dia estava ensolarado e a cidade de Coari recebia a comitiva do governador Danilo Areosa. O então prefeito, Mussa Abrahim Neto (1969 a 1973), foi responsável pela recepção da comitiva e pela organização de um dia repleto de festividades inesquecíveis para a população coariense.

movimento de educação de base

O serviço que se destacou positivamente em Coari, durante a década de 1970, foi o trabalho de educação sanitária realizado pela MEB, por meio da Rádio Educacional de Coari e pela Prelazia de Coari. O programa contava com a participação de duas enfermeiras voluntárias: uma delas era bolsista da ONU e a outra havia se formado na Faculdade de Enfermagem de Ribeirão Preto e foi recrutada pela SUSEMI para realizar um estágio não remunerado.

O programa tinha como objetivo promover a integralidade humana e combater a desigualdade social através de programas de educação popular libertadora ao longo da vida. Sua atuação se concentrava na educação de jovens e adultos, utilizando o método “ver, julgar e agir”, em consonância com os princípios filosóficos do renomado educador Paulo Freire.

Além das atividades mencionadas, eram realizadas também chamadas radiofônicas (vinhetas) abordando noções de higiene, cuidados médicos, alimentação, educação sexual, parto, entre outros temas. Os conteúdos eram repetidos através de reuniões, palestras e debates com os indivíduos recrutados nas comunidades rurais.

Uma das principais dificuldades enfrentadas pelo sistema radiofônico de Coari (Rádio Educacional Rural de Coari) foi a limitação da potência dos seus transmissores, os quais não conseguiam alcançar uma área além de 50 km a partir da sede.

O jornal “O Globo” em 31 de outubro de 1972, publicou:

1970

Fundação Sesp

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Em 1968, a cidade de Coari possuía apenas de uma unidade médica, mantida pela Fundação Especial de Saúde Pública (SESP), em regime de ambulatório. Havia um único médico na cidade para uma população urbana de mais de 10.000 habitantes. O médico era também o diretor do posto, a cujo horário de funcionamento estavam limitados aos serviços que ele prestava.

O posto do SESP em Coari foi instalado em 1943, na rua 5 de setembro, no Centro de Coari (atual policlínica Dr. Roque Juan Del’oso). Ao lado do SESP foi construída uma residência para médico em 1962, toda projetada e com verba especifica para essa construção.

Já na no ano de 1977, a Fundação SESP foi responsável pela instalação do laboratório e a estação de tratamento de água de Coari, após um surto de hepatite que aconteceu na cidade.

1970
Unidade sanitária do Fundação de Serviço de Saúde Pública em Coari

TELEFONES EM COARI

A CAMTEL (Companhia Amazonense de Telecomunicações) foi fundada em 1965 com financiamento do BASA (Banco da Amazônia S.A.). Essa foi a primeira iniciativa de financiamento do BASA na região amazônica após sua última mudança de nome. As quatro primeiras cidades a receber o sistema telefônico da CAMTEL foram Manacapuru, Itacoatiara, Parintins e Coari.

1970

Em 6 de agosto de 1967, o governador Danilo Areosa fez uma viagem institucional a cidade de Coari no navio “Rio Grande”. Nessa viagem, a comitiva foi recebida pelo prefeito Clemente Vieira e do deputado estadual Dorval Vieira. Houve várias visitas e inaugurações, das quais, destacamos:

  1. A inauguração do grupo escolar Inês Vieira;
  2. A entrega dos serviços de pavimentação das ruas Independência, TV Mota e XV de novembro;
  3. A visita das obras da Celetramazon;
  4. A visita às instalações da CAMTEL, que estava funcionando em caráter experimental com apenas 01 canal para teste de operação.

No dia 7 de setembro, a CAMTEL começou a operar com dois canais, porém ainda de forma experimental até a sua inauguração oficial.

No dia 23 de setembro de 1967, o governador retornou a Coari, porém com um pequeno atraso devido a um problema no Navio “Rio Grande”. Apesar disso, às 22h, ele conseguiu inaugurar os serviços da Central Elétrica de Coari — Celetramazon.

SERVIÇOS: A Celetramazon investiu nada menos que NCr$ 450.000.00 na construção da central elétrica em Coari. A central é composta por dois grupos geradores GM provisórios, com capacidade de 144 KVA cada. Esses grupos geradores estão operando de forma ininterrupta, fornecendo luz e energia para a cidade de Coari durante 24 horas por dia.

Em 24 de setembro de 1967, ocorreu a inauguração da CAMTEL (Companhia Amazonense de Telecomunicações) utilizando o sistema SSB. A partir desse momento, a cidade de Coari passou a ter a possibilidade de se comunicar com Manaus, Manacapuru, Itacoatiara e Parintins.

Serviço: A Central radiotelefônica de Coari, construída pela CAMTEL, teve um custo aproximado de NCr$ 100.000,00.

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Agências bancárias

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Existiam duas agências bancárias em Coari: o BASA, Banco da Amazônia S/A, e o BEA, Banco do Estado do Amazonas S/A. O BEA começou a operar em 6 de novembro de 1968, enquanto o BASA foi inaugurado em 25 de setembro de 1956.

As agências bancárias do município representavam o setor de crédito, oferecendo serviços como Carteira Agrícola e de Descontos. A concessão de empréstimos tinha um prazo máximo de 120 dias. O Banco do Brasil em Tefé se destacava por ter uma alta demanda de financiamentos, tanto em quantidade quanto em prazos mais longos.

1970

A inauguração do BEA, Fórum de Coari e Exatoria de Rendas

1970

No dia 4 de dezembro de 1969, uma quinta-feira, às 12h, o governador do Amazonas, Danilo Areosa, desembarcou em Coari em companhia de uma comitiva composta por secretários estaduais e autoridades locais.

O governador e sua comitiva foram recebidos pelo prefeito Mussa Abrahim Netto, que os acompanhou pelas principais obras em andamento na cidade. A primeira parada foi no novo prédio do Banco do Estado do Amazonas (BEA). O gerente da agência recebeu o governador Areosa e lhe apresentou as dependências do prédio. Areosa ficou impressionado com o tamanho e a modernidade da agência. Ele elogiou o trabalho da equipe responsável pela construção e disse que a sucursal seria um significativo instrumento para o desenvolvimento econômico de Coari.

A população compareceu em massa para celebrar a inauguração do novo prédio, que era a antiga prefeitura municipal de Coari, localizada na praça Getúlio Vargas com rua XV de Novembro.

A próxima parada foi no novo prédio do Fórum de Coari, onde houve a cerimônia de inauguração. O governador Areosa foi recebido pelo juiz titular do fórum, que lhe apresentou as dependências do edifício. Areosa e o juiz titular do fórum discursaram em frente ao prédio para a população presente. Ele disse que o prédio era moderno e funcional, e iria proporcionar melhores condições de trabalho para os servidores da Justiça. Houve também, a entrega das residências do juiz de direito e do promotor, que ficavam ao lado do Fórum de Coari.

No final da tarde, a comitiva também visitou o novo prédio da exatoria de rendas para a cerimônia de inauguração daquela repartição pública. A exatoria era o órgão responsável pela arrecadação de impostos estaduais no município de Coari. O governador Areosa foi recebido pelo coletor de rendas da exatoria.

O governador Danilo Areosa e o prefeito Mussa Abrahim Netto cortaram a fita inaugural e o prédio foi aberto ao público. Na mesma cerimônia foram entregues duas residências, uma para o coletor e a outra para um funcionário que seria transferido para Coari.

A população também compareceu em massa para celebrar a entrega do prédio. O novo prédio da Exatoria de Rendas foi um significativo instrumento para o sistema tributário de Coari, pois proporcionou aos comerciantes melhores condições de acesso aos serviços da Receita Estadual.

O último compromisso do governador Danilo Areosa na viagem a Coari foi a visita técnica e de vistoria as obras da Unidade Mista de Coari (hospital da SUSEMI) que estavam na fase inicial do projeto.

A Crise no Governo de Mussa

1970

No segundo semestre de 1969, a administração municipal de Coari, sob a liderança do Prefeito Mussa Abrahim Netto, enfrentou uma crise financeira devido à suspensão das cotas do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e do Fundo Rodoviário Nacional (FRN). Essa suspensão foi ocasionada pela não prestação de contas do exercício de 1968 pelo governo de Clemente Soares Vieira.

Com a retenção dessas verbas, as atividades da Prefeitura foram praticamente paralisadas, resultando em atraso no pagamento dos professores municipais e nas contas de luz da prefeitura e das demais autarquias municipais, que ficaram em débito com a CELETRAMAZON. Esse atraso levou ao corte no fornecimento de energia elétrica e na iluminação pública da cidade de Coari.

A organização e aprovação das contas passadas, cujos raros documentos comprovativos se encontravam na maior desordem, exigiria uma atitude de colaboração entre o governo anterior de Clemente Soares Vieira e de Mussa Abrahim Neto. Contudo, o antagonismo entre as duas facções políticas está longe de permitir.

Por outro lado, a opção legal para liberar as cotas seria abrir um inquérito administrativo contra a administração anterior. No entanto, o prefeito Mussa Abrahim Netto tem evitado esse procedimento devido ao receio de reacender as tensões políticas já exaltadas no município de Coari.

O impasse perdurou até janeiro de 1970 quando, mediante a abertura de inquérito, foram liberadas as primeiras cotas retidas, com a promessa da progressiva regularização da situação.

A antiga prefeitura construída em estilo colonial no século XIX, localizada na praça Getúlio Vargas, foi demolida para construção da agência do BEA. Dessa forma, as instalações da prefeitura de Coari foram transferidas para o prédio inativo do hospital N. S. do Socorro, ao lado do convento das irmãs ASC, na rua Gilberto Mestrinho.

Devido à imprudência da mudança das instalações da prefeitura, e a pre­cariedade das atuais instalações, o arquivo da Prefeitura de Coari se encontrava ainda em completa desordem, estando parte encaixotado e alguns documentos guardados em residências particulares.

Havia um evidente descuido, como é o caso do setor de contabilidade da prefeitura, que estava operando de forma ineficiente. O livro-caixa estava atrasado há vários meses e os balancetes mensais estavam paralisados desde agosto de 1969. Além disso, os livros-caixa eram preenchidos manualmente e frequentemente apresentavam rasuras. O orçamento e a prestação de contas foram elaborados com a ajuda de um técnico de contabilidade contratado temporariamente.

A arrecadação era muito insignificante, apesar da capacidade tributaria da população, devido em grande parte, a falta de fiscalização e desorganização dos serviços. As fichas cadastrais só eram preenchidas à medida que os proprietários iam à prefeitura tratar de aforamento ou pagamento de impostos.

Educação em Coari

O município de Coari, enfrentava desafios significativos na área da educação em 1970. A prefeitura não prestava serviço algum direto neste setor tão significativo, a não ser a através do pagamento dos vencimentos dos professores rurais e manutenção das pequenas escolas rurais.

O ensino na zona urbana é coordenado pela Secretaria de Estado da Educação, com a importante participação das entidades religiosas do município. Dentre essas entidades, destacam-se a escola Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, em convênio com a igreja Católica, e o Instituto Bereano de Coari, da Igreja Batista de Coari. Além dessas instituições, temos também o grupo escolar Francisco Lopes Braga, a recém-inaugurada Inês de Nazaré Vieira e o Iraci Leitão, inaugurada em 19 de abril de 1951.

1970

Obras Públicas

Os serviços viários municipais estavam paralisados no ano de 1969, pois, houve a retenção das cotas de FRN até janeiro de 1970. As vias urbanas de Coari estavam em estado precário, com alguns trechos potencialmente intransitáveis.

Os serviços viários municipais estavam paralisados no ano de 1969, pois, houve a retenção das cotas de FRN até janeiro de 1970. As vias urbanas de Coari estavam em estado precário, com alguns trechos potencialmente intransitáveis.

As obras executadas no exercício de 1969 foram: A construção dois grupos escolares na zona rural, a mudança do sistema de iluminação da praça, aquisição e instalação de um motor elétrico para a Vila do Camará, e alguns reparos na delegacia municipal e no mercado.

A construção da Câmara Municipal e a pavimentação da Rua Plínio Coelho estão paralisadas.

SANEAMENTO

O sistema de abastecimento de água de Coari foi implantado em agosto de 1967 pelo Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE). Além do abastecimento d’água, outros serviços urbanos relacionados com a saúde pública eram prestados em comum pela Prefeitura de Coari e a Fundação SESP, com a maior ou menor participação de cada entidade.

Em 1970, as responsabilidades que tocam a cada um, diante das iniciativas de saneamento, não são claramente compreendidas pelas autoridades e muito menos pela população de Coari, pairando um clima de omissão e de acusações mutuas diante de iniciativas tais como a conclusão do segundo filtro d’água, o abate do gado ou o despejo do lixo.

A cidade não possuía um matadouro, sendo o gado abatido na praia próxima ao atracadouro, expondo a carne a toda espécie de conta­minação.

A FSESP já havia dirigido aos poderes municipais diversos ofícios sobre o assunto, oferecendo, inclusive, projeto para construção de um matadouro a ser empreendida e financiada pela Fundação, para posterior pagamento pela Prefeitura. A administração de Mussa Abrahim Netto entendia que a crise financeira que atravessava não lhe permitiria empenhar a verba correspondente ao matadouro, reivindicando o custeio da obra aos níveis superiores do governo.

Enquanto permanecia o impasse, o posto do FSESP se recusava a examinar o gado de corte, sob a alegação de que ao liberar o animal vivo, estaria, implicitamente, endossando o consumo daquelas carnes, responsabilidade que nas condições em que se processava o abate, não é possível assumir.

O mercado municipal, naquela época, tão pouco apresentava condições mínimas de higiene, principalmente no tocante ao manuseio e estocagem do pescado.

A prefeitura não operava a coleta do lixo, tendo mantido entendimentos preliminares com a Fundação SESP para a localização dos despejos, embora não se tenha ainda chegado a um acordo.

ESGOTOS

A situação de esgotos se tornou a cada dia mais crítica com o adensamento da população urbana. O único ramal existente se restringia a rua XV de Novembro e foi construído em 1938, na administração de Alexandre Montoril. O diâmetro da rede de esgoto era insuficiente para a demanda de 1970, e seu funcionamento era precário, mesmo se fossem reparados os diversos trechos da tubulação e caixas de inspeção danificadas.

Havia na cidade, um pequeno número de prédios públicos e casas particulares que dispunham de tanques sépticos, cujo custo era bastante elevado para o poder aquisitivo médio da população.

A fossa seca, única solução individual economicamente viável para a maioria da população, tem a sua eficiência comprometida pelo baixo grau de permeabilidade do solo na região, que mantém alagada uma grande parte da área urbana na estação chuvosa.

O problema vinha se agravando com o grande crescimento demográfico experimentado pela cidade de Coari nos últimos anos. A falta de áreas adequadas de expansão urbana, vinha gerando a ocupação indiscriminada dos terrenos não reclamados das margens dos Igarapés.

Era o caso do córrego compreendido entre as ruas 2 de agosto e Major Zeca, atingido pelo igarapé de São Pedro nas ocasiões de grande cheia, aonde um levantamento identificou 228 casas cujas fossas, quando existiam, não apresentavam qualquer utilidade sanitária.

ABASTECIMENTO DE ÁGUA

Desde 1967, a cidade dispõe de um sistema público de abastecimento de água, administrado pelo SAAE (Serviço Autônomo de Águas e Esgotos). O SAAE foi uma autarquia resultante de um convênio entre a Fundação SESP e a Prefeitura de Coari.

A captação de água era realizada diretamente do lago de Coari, devido aos resultados negativos obtidos nas análises da água subterrânea. A transferência da água para a estação de tratamento era feita por meio de uma bomba MWM de 26 HP, que operava por sete horas.

O sistema apresentava como principal inconveniente o risco representado pelos banzeiros, que ocorriam com frequência durante as épocas de cheias. Esses banzeiros do lago de Coari ameaçavam a destruição do flutuante e o afundamento de todo equipamento.

A estação de tratamento possuía dois filtros lentos, sendo que um deles ainda estava em construção. Isso resultava na interrupção do fornecimento de água durante a limpeza periódica do filtro em operação.

A água tratada era transportada por duas bombas, uma de 10 HP e outra de 15 HP, para um reservatório elevado com capacidade para 100.000 litros. Em seguida, era direcionada para a rede de distribuição, com o objetivo de abastecer a população.

Em 1970, a rede de distribuição de água estava se tornando insuficiente devido ao crescimento da população. Isso resultou em áreas densamente povoadas, como o bairro de Chagas Aguiar, que não estavam recebendo abastecimento adequado de água.

Dos 600 lotes servidos pela rede em 1970, apenas 350 estavam ligados. O problema, embora principalmente estivesse relacionado com a incapacidade financeira dos moradores em pagar a tarifa de água de Cr$ 77,36 por ano, também envolve aspectos subjetivos de falta de valorização da água encanada.

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A HISTÓRIA DA OCUPAÇÃO

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Em 1854, teve início a transferência do núcleo do município da antiga freguesia de Alvelos, localizada no lago de Coari, para as terras próximas ao rio Solimões, que ficou conhecido como “Coari Novo”. Posteriormente, em 1874, foi criada a vila de Coari, juntamente com a oficialização do município, que se separou de Tefé em 1848, dois anos antes da criação da província do Amazonas.

A ocupação da região ocorreu a partir de dois núcleos iniciais que eram separados pelo igarapé de São Pedro. A oeste, na localidade de Tauá-mirim, foi construído o bairro de Santana. Já a leste do igarapé de São Pedro, foi construído o bairro de São Sebastião, que atualmente é conhecido como Centro. Nessa faixa de terra firme, foram implantados o atracadouro (escadaria) e os principais edifícios civis e religiosos, caracterizando o centro comercial e administrativo da vila.

Existia uma ponte, denominada de Cap. Pessoa, que atravessava o igarapé de São Pedro. Ela foi construída com madeira de lei, numa extensão de 100 metros. O superintendente municipal Celso do Menezes foi quem projetou e inaugurou a ponte em 1896. Ao lado da ponte e a margem do igarapé, existia uma escada lateral que permitia o acesso aos passageiros que desembarcavam ali durante as enchentes, e também possibilitando o atracamento de barcos.

Em 1932, Coari foi elevada à categoria de cidade, o que resultou na criação da câmara de vereadores para legislar, fiscalizar e propor melhorias para a população de Coari. Esse marco representou a emancipação administrativa do município, permitindo que a cidade gerisse seu próprio orçamento através do prefeito. Na época, durante o período do golpe militar de 1930, o senhor Alexandre Montoril, militar com a patente de capitão, foi nomeado como prefeito.

Na direção oposta, no ano de 1970, observava-se um grande desenvolvimento no bairro de Chagas Aguiar. Especialmente com a conclusão da ponte sobre o igarapé do Espírito Santo (atualmente ponte Roberval Rodrigues) em 1965, cujos primeiros pilares foram assentados em 1938.

O centro comercial e administrativo da cidade permaneceu concentrado em torno da rua XV de Novembro e duas ruas transversais: a rua 7 de Agosto (atualmente conhecida como travessa Raimundo Mota) e a Praça Getúlio Vargas. Ao longo deste eixo, era possível observar a predominância de estabelecimentos com características de atacado na extremidade inferior, próxima ao antigo trapiche.

No topo da colina, formada nas imediações da Praça São Sebastião, estão localizados os principais prédios da administração pública: o Fórum de Justiça, a Exatoria de Rendas, a Camtel, os Correios, a Prefeitura, etc. A expansão da zona comercial, limitada ao sul pelos terrenos da Prelazia e da igreja, tende a ocupar as ruas Gilberto Mestrinho, Independência formando uma quadra de 150 metros do lado que concentrara todo o comércio de características centrais.

SISTEMA VIÁRIO

Em 1970, a cidade de Coari possuía somente 2.150 metros de vias pavimentadas, sendo que nas poucas ruas asfaltadas, o asfalto foi aplicado diretamente sobre a terra, o que resultava em uma diminuição na eficiência e durabilidade do calçamento.

Algumas ruas, como a 7 de agosto e a Independência, eram calçadas com tijolos de barro, o que era uma solução ideal para o baixo tráfego de veículos e a disponibilidade abundante desse material na cidade. Além disso, essa escolha permitia aproveitar a mão de obra local tanto no assentamento das peças quanto na sua fabricação.

As demais vias da cidade enfrentam dificuldades no tráfego durante a época das chuvas devido à capacidade limitada de absorção do solo e ao alto índice pluviométrico. Devido ao relevo acidentado de Coari, ao longo do tempo, foi necessário construir uma série de pontes para atravessar as áreas alagadas.

Entre as pontes da cidade, a mais antiga é a Ponte Cap. Pessoa, que foi construída sobre o igarapé de São Pedro. Infelizmente, após uma das grandes enchentes da década de 1950, a ponte foi destruída, o que deixou os bairros da margem ocidental do igarapé sem uma conexão direta com o centro da cidade.

As vias urbanas de Coari em 1970 não eram arborizadas, o que era um grande incômodo numa região de intenso calor ao longo do ano.

A ENERGIA ELÉTRICA

Em 1970, o sistema utilizava 03 motores a diesel, com uma potência disponível de 660 KVA. A extensão da rede de distribuição era de 8.500 metros, cobrindo quase todas as ruas da cidade. O número de ligações, entretanto, era de aproximadamente 300, ou seja, a quarta parte dos domicílios eram atendidos pela rede.

O alto custo da energia termelétrica e a baixa renda da população são fatores que contribuem para o baixo fator de utilização do sistema, especialmente no interior do Amazonas.

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TRANSPORTE HIDROVIÁRIO

O transporte de passageiros entre Manaus e Coari era feito por “barcos recreios”. O transporte de carga era inexpressivo em relação ao movimento entre Manaus e o interior do Estado, que, por sua vez, não apresentava senão 12,5% da carga transportada entre Manaus e os outros portos do país e do estrangeiro.

A cidade não contava com nenhuma infraestrutura portuária adequada para o embarque e desembarque de passageiros, bem como para a movimentação de carga. A única solução encontrada foi utilizar pranchas entre o convés dos barcos e a praia.

TRANSPORTE RODOVIÁRIO

O município de Coari não possuía nenhuma rodovia intermunicipal. Internamente, apenas havia uma estrada que ligava a sede do município ao lago do Mamiá, passando pelo aeroporto que estava em construção. O tráfego era precário, sobretudo durante a estação chuvosa, devido à baixa permeabilidade do solo e à falta de um sistema adequado de escoamento das águas pluviais.

TRANSPORTE AÉREO

Com a retirada de tráfego dos aviões Catalina da Panair, e enquanto se aguardava a conclusão do campo de pouso, a cidade de Coari não era servida por transporte aéreo regular em 1970. Os aviões anfíbios da FAB (Força Aérea Brasileira), a pequena aeronave da Prelazia e os táxis-aéreos a serviço dos comerciantes pousavam nas águas do lago Coari.

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Avião Catalina da Panair no lago de Coari.

CONCLUSÃO

A década de 1960 e 1970 foi um período de modernização para Coari, no Amazonas. A cidade passou por profundas transformações econômicas, sociais e culturais, que contribuíram para o seu desenvolvimento e fortalecimento. O fim do ciclo da castanha-do-pará, a crise econômica de 1968 e a chegada de novas políticas públicas do governo federal foram alguns dos fatores que impulsionaram esse processo.

No campo econômico, a cidade passou a se diversificar, com o desenvolvimento de outras atividades econômicas, como o comércio, a agricultura e a pesca. No campo social, houve avanços na educação, na saúde e na infraestrutura. A inauguração de novas obras e serviços públicos, como a Central Elétrica, a CAMTEL, o BEA e a Unidade Mista de Saúde, contribuiu para melhorar a qualidade de vida da população e para fortalecer a identidade coariense. As transformações da década de 1960 e 1970 deixaram um legado importante para Coari, que se tornou uma cidade mais moderna, diversificada e inclusiva.

Archipo Wilson Cavalcante Góes
Coari, 2 de novembro de 2023

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Archipo Góes

O Trio Guadalupe – 1987

O texto narra as memórias da autora sobre sua infância na década de 80, marcada pela paixão por filmes de dança e pela amizade com Sirlene Bezerra Guimarães e Ráifran Silene Souza. Juntas, as três formavam o Trio Guadalupe, um grupo informal que se apresentava em eventos escolares e da comunidade, coreografando e dançando com entusiasmo. O relato destaca a criatividade e a alegria das meninas, que improvisavam figurinos e coreografias, e a importância da amizade que as uniu. Apesar do fim do trio, as memórias das apresentações e da cumplicidade entre as amigas permanecem como um símbolo daquela época especial.

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maçaricos
Literatura
Archipo Góes

Os maçaricos do igarapé do Espírito Santo têm nomes

Maçaricos, aves e crianças, brincavam lado a lado no Igarapé do Espírito Santo em Coari–AM. Um local de rica vida natural e brincadeiras, o igarapé variava com as cheias e secas, proporcionando pesca, caça e momentos marcantes como a brincadeira de “maçaricos colossais” na lama. O texto lamenta a perda da inocência e da natureza devido à exploração do gás do Rio Urucu e faz um apelo para proteger as crianças e o meio ambiente.

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França
Literatura
Archipo Góes

O boi de França e o boi de Ioiô

O texto “O boi de França e o boi de Ioiô” é um importante documento histórico que contribui para a compreensão da cultura popular e da tradição do boi-bumbá no Amazonas. Através de uma narrativa rica em detalhes, o autor nos leva de volta ao ano de 1927 e nos apresenta aos personagens e eventos que marcaram a introdução dessa importante manifestação cultural em Coari.

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Corpo Santo
Literatura
Archipo Góes

Um Corpo Santo e as serpentes na brisa leve e na água agitada

O texto “Um Corpo Santo e as serpentes na brisa leve e na água agitada” é um belo exemplo de como a literatura pode ser usada para retratar a realidade social e ambiental da Amazônia. Através de uma linguagem rica e poética, o autor nos convida a refletir sobre a vida dos ribeirinhos, a beleza da natureza e a importância da preservação ambiental e social.

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Coari

Direiros Autorais

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